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Krânio Metálico - craniotomia: início, meio, fim… | A biografia da banda

Atualizado: 21 de out.


Quem curte rock pesado em Salvador, certamente, já ouviu falar da banda “Krânio Metálico”,  mas a maioria — cabe aqui o provérbio “ZecaPagodiano” adaptado — “nunca viu, nem ouviu, só ouve falar”, pois a banda esteve em atividade na década de 80, fez muitos shows, nada gravou, e há pouquíssimos registros visuais divulgados. Até a data de finalização deste texto só há um registro sonoro, bastante precário, que está disponível no YouTube. Daí o motivo pelo qual a banda entrou para o reino místico dos headbangers soteropolitanos e também do Brasil adentro. Só quem viveu aquela época pôde constatar de fato a existência do “Krânio Metálico”.  Pode-se dizer que a banda não acabou, mas entrou num “hiato-consonantal-vocálico” que já dura mais de três décadas, mas por que digo que a banda não acabou? Porque em todo esse tempo o nome da banda esteve e está presente no imaginário do rock baiano, e os remanescentes da banda se fazem presente no cenário como público, e sempre são lembrados e cobrados sobre a volta da banda. E como vocês vão ver na entrevista que fiz com dois dos integrantes, a vontade de se fazer presente e de continuar a banda nunca se acabou, nunca deixou de existir, e não houve em qualquer momento uma reunião da banda para, de fato, atestar o seu fim. Nunca foram ditas as palavras “Eh, caras… não dá mais. O “Krânio Metálico acabou”... ele parou, mas o Krânio está em algum lugar guardado, empoeirado, opaco, inativo, mas no reino imaginário, enérgico ainda existe.


Os primeiros registros fotográficos e o único sonoro só começam a aparecer por agora graças ao Deus “Redes Sociais”. O que deu uma chacoalhada nas memórias dos headbangers que conheceram a banda e dos que não conheceram, mas ouvem falar. Isso ressoou nos integrantes e aguçou a possibilidade de retomá-la, ao ponto de criarem uma página no instagram (@kraniometalico_) para divulgar materiais sobre a banda, que apesar de ter pouquíssima coisa divulgada, tem coisa pra caralho guardada a sete chaves com um dos integrantes. Então aos poucos a sepultura em que está enterrada o “Krânio Metálico” está sendo aberta e há movimentos se formando para que muito em breve este Krânio possa ser limpo, sacudido, polido e volte a brilhar. 


Foi com esta intenção, de dar uma soprada na poeira, que após ver uma das postagens na página (@90uderbahia) — uma página dedicada a manter e divulgar a memória do rock baiano —, que fui atrás dos caras e consegui uma entrevista super bacana, onde passamos uma tarde de sábado extremamente agradável na casa do cuidadoso anfitrião Jorge Kiss, para relembrar a história do “Krânio Metálico”. Então nas linhas seguintes estão uma espécie de craniotomia: início, meio, fim… e possível retorno da banda!


A entrevista foi feita com dois dos integrantes remanescentes da formação original: Miltão (baterista) e Jorge Kiss (vocalista e letrista), figuras simpaticíssimas do nosso cenário de peso. Nesta entrevista passeamos por absolutamente toda a história da banda, desde a fase pré-Krânio até os dias atuais, que esbarra no intuito de uma retomada para finalmente revelar essa entidade que se tornou a banda.


Pré-Krânio Metálico - Final dos anos 70

Miltão - Milton S. R., soteropolitano, morador do Stiep, atualmente professor universitário na UEFS, leciona a matéria de Física, está com os seus duvidosos 64 anos, pois possui uma vitalidade metálica. Além de professor, é engajado nas lutas dos movimentos sociais e contra a opressão, fascismo, racismo e toda filhadaputagem que possa existir neste mundinho que vivemos. Miltão conta que seus primeiros contatos sonoros voltados para o senhor rock, se deram graças ao ambiente escolar, onde estudava Instrumentação Industrial, no famoso CEFET (Centro Federal de Educação e Tecnologia), que segundo ele possuía uma liberdade eclética artística e tinha um grêmio bem ativo que incentivava e fazia circular diversas formas de artes, entre elas a música. Foi lá, através dos colegas e dos pequenos festivais que ocorriam no colégio, que ficou conhecendo bandas como Led Zeppelin, Black Sabbath, Judas Priest, King Diamond, Deep Purple, Camisa de Vênus, Raul Seixas... A partir daí surgiu a vontade de ter uma banda e a identificação com as baterias das bandas que conheceu e passou a escutar cotidianamente.


A vontade se concretizou e com os amigos: Eduardo Scott (vocal), Paulo Gusmão (guitarra), Miguel Baiense (baixo) e ele na bateria, formaram a Gonorreia, uma banda que fazia uma mescla de rock clássico com pitadas de punk. Isso já no comecinho dos anos 80. A banda fez vários shows, mas não deixou registro sonoro com os integrantes oficiais, mas Miltão diz que há um registro de gravação feito às escondidas em um de seus shows, e que está perdido por aí. A Gonorreia com está formação não durou muito, mas foi uma espécie de escola para o futuro musical de Miltão.


Jorge Kiss - Jorge L. S. 66 anos, soteropolitano, morador de Brotas, atualmente aposentado pela Município, descendente de portugueses e indígenas, é basicamente uma fraude sexagenária, pois o cara tem a pele e a cara de um moleque, isso só comprova que o Metal é um elixir. Diz que jogou muita bola pela escola do Bahia, entre os 13 e 15 anos. Nasceu na Barra, defronte ao mar, o que justifica a paixão pela praia. Por volta dos 11 anos se muda para Brotas, passa pelos colégios Maria Quitéria, Góes Calmon e se forma no Luís Viana em Auxiliar de Análise Química de Laboratório. Na família tem um pai desenhista, que foi servidor do museu de Arte Sacra da Bahia, e ele também desenha. Além disso, Jorge é um esportista tendo formação em Taekwondo e Capoeira. Ainda frequentador assíduo das praias baianas para “bater uma bolinha com os amigos” e em sua juventude a praia era o um dos pontos de encontro para pegar “ondas de peito e socializar com a turma para paquerar e planejar as baladas das noites… muitas vezes eu ia salgado mesmo — risos — saia da praia direto para festinhas e encontros com a galera pela noite”. Além da praia, tanto Jorge quanto Miltão relembram de um pointe chamado “Tonys”, uma lanchonete, localizado na Pituba, onde os jovens se reuniam para passar as tarde resenhando e decidindo o que fariam às noites. Essas festas juvenis eram regadas a muito Rock e Heavy Metal, foi neste cenário que Jorge teve seus primeiros contatos sonoros de peso e também conheceu Miltão, na época com o Gonorreia. Aqui fica uma tétrica pergunta a você, leitor headbanger da atualidade: quando foi que você saiu de sua casa para ir a uma festa/encontro, para escutar Rock, Metal? 


Nesta fase Jorge foi apresentado a bandas como Deep Purple, Dio, Nazareth, Iron Maiden, Slayer, e nos conta uma memória afetiva do caralho, na qual ele havia enviado uma carta (para quem tem menos de 30 anos, carta é uma espécie de e-mail analógico, em papel) para um programa de TV apresentado por Waldir Serrão, conhecido como Big Ben, e também como um dos pais do rock baiano. Em seu auge como apresentador chegou a ter um programa na TV Itapoan que era dedicado ao estilo, e foi neste programa que sorteou um LP do Led Zeppelin, e nessa ocasião o ganhador foi o Jorge Kiss. “Fiquei muito feliz. Esse disco está comigo até hoje”, relembra Jorge.


A formação do Krânio Metálico - início dos anos 80

Nas festas supracitadas Jorge sempre se destacava, pois era comum ficar cantando as músicas, e nas resenhas com os amigos também fazia cantoria embalado pelo violão de seu irmão, Paulinho. Enquanto isso a banda Gonorreia já não existia mais, mas os jovens queriam continuar a fazer música. Então, Paulo Gusmão (ex-Gonorreia) diz a Miltão que conhecia um cara que cantava. Esse cara era o Jorge Kiss, daí surge a gênese do “KM” com Jorge Kiss (vocais), Miltão (bateria) e Paulo Gusmão (guitarra). Com essa formação ainda sem nome, eles ensaiam por uns meses, e com o passar do tempo o som dessa banda pré “KM” acabou ficando muito pesado e Paulo Gusmão (guitarrista) não curtiu tanto o som pesado e decidiu cair fora sem mágoas e atritos, para seguir seu caminho com o Hard Rock. Jorge Kiss, então, convoca seu irmão, Paulinho para a guitarra, e este chama o amigo Jorginho para a outra guitarra, e para o baixo, vem o irmão de Caius (grande amigo de Miltão), o Luciano — estava formado o Krânio Metálico. Os ensaios continuam, o peso vai aumentando e a banda vai se lapidando nos ensaios nas casas dos integrantes, pelas garagens dos bairros do STIEP, Brotas e Barros Reis. 


Com o passar dos meses de 1984 houve a necessidade de se criar um nome já que o objetivo era tocar ao vivo. Jorge sugeriu o crânio com “K”. Militão completou “Krânio de metal…”, então chegaram no nome “Krânio Metálico”, que tem algumas boas curiosidades: 01) não tem nada a ver com o Metallica; 02) não se enganem e pensem que o “K” do Crânio é mera estética. Miltão nesta época já estudava Física, então associou o KM da física, que significa velocidade, ao objetivo da banda, que era o de fazer som pesado, veloz e furioso, tanto que eles têm uma música chamada “Velocidade da luz”.


As músicas foram se formando, a banda se aprumando e começou a temporada de caça a shows. Como as opções eram bem restritas para a época — e continua a ser atualmente — a banda usou a cabeça e passou a pleitear as pautas de teatros de Salvador, o que mostra a maturidade organizacional de ocupar os espaços da cidade, tanto que seu primeiro e histórico show, depois de cerca de oito meses de ensaio, ocorreu no teatro Solar Boa vista, com a casa cheia, no dia 21 de abril de 1985. O show foi intitulado de “Defensores do Heavy Metal”. O mérito da divulgação ficou com o “feed das ruas” onde os integrantes da banda saíam com suas latas de spray pichando muros avisando o dia, local e hora do show. Mesma técnica usada pelo Camisa de Vênus na mesma época. 


Os ensaios e a produção das letras não paravam — compostas inicialmente por Jorge e Paulinho e depois tinha a participação de todos os outros integrantes. Os temas transitavam entre o capirotismo, críticas sociais e a paixão pelo Metal. Já nos primeiros shows o “KM” tinha um repertório autoral com músicas como: 666, Bravos Headbangers, Suco de sangue, Cidade do Massacre, Velocidade da Luz, Defensores do Metal dentre outras. Ao repertório autoral era acrescentado covers do Iron Maiden, Slayer, Judas Priest e outras. Os shows se tornaram constantes em locais como: Solar Boa Vista, Vila Velha, Galpão, Clube de Engenharia, CEFET, Boca de Brasa, e o nome da banda vai se espalhando boca a boca entre o mundo Metal de tal forma, que mesmo sem possuir qualquer material registrado, uma boa parte do Brasil já conhecia o nome “Krânio Metálico” e os shows começam a invadir o interior da Bahia, então se torna comum, shows em cidades baianas como: Itabuna, Uruçuca, Feira de Santana, Alagoinhas, Ipirá, Ilhéus, Itaberaba. Em alguns desses interiores ocorreram encontros épicos dos guerreiros primitivos do Metal. Em Feira de Santana, no dia 18/09/1987 aconteceu o show com as bandas Vodu e Viper, que mesmo desfalcado de um guitarrista e do vocalista Andre Mattos, fez um grande show com o guitarrista Pit (R.I.P.) segurando a onda. Em Itabuna chegaram ao ponto de receber de um fã um crânio — supostamente humano — pintado de prateado. Também em Itabuna ocorreu a primeira parte da história épica “Krânio Metálico X Vulcano”, que eu contarei mais adiante.


Vale ressaltar que além de se apropriar de espaços públicos para mostrarem seu trabalho e atestar que o Metal, para aquela época, um objeto absolutamente indigno, estranho e inaceito, fazia parte, sim, da sociedade e deveria estar presente em todos os lugares. O “KM" se fazia do melhor que podia ter, desde os instrumentos, que era algo difícil de se ter acesso, até os equipamentos de sons que sempre se comprometiam a dispor do melhor equipamento sonoro que pudessem ter acesso. Pode-se dizer que o “KM” além de ser uma das pioneiras do Metal no Brasil e certamente a primeira na Bahia, foi também uma das primeiras bandas do gênero a se profissionalizar quando pensado em alguns aspectos de sua história. E isso sem contar que o crânio gritante metálico da banda era um crânio negro, que reluzia todo o ódio e fúria espelhado pela sociedade. Muitas vezes o “KM” passou por preconceitos. Não era incomum serem alvo de chacotas, estranhamento, terem seus cartazes pichados rechaçados com escritos do tipo “Jesus sim! Rock não!”, serem acusados de fazerem playback, e até mesmo serem discriminados por suas origens nordestinas.


Nessa época, basicamente, havia de rock em Salvador Raul Seixas, Camisa de Vênus, Mar Morto (que tinha em sua formação Carlinhos Brown), Cabo de Guerra (que tinha Ricardo chaves nos vocais), Diário Oficial (com Tuca Fernandes nos vocais), e seus maiores parceiros: as bandas Zona Abissal, que fazia um Rock clássico e Dever de Classe, banda punk ainda em atividade. O que mostra um extremo respeito na convivência entre as tribos. Em um episódio, Miltão conta “Em um dos nossos shows no Galpão, no Rio Vermelho, a guitarra do Dever de Classe deu problema e eles tocaram com a flying-V do “KM’”, o que mostra um ambiente de respeito e cooperação entre as tribos (ao menos nesta parte do cenário que envolvia tais bandas).


Em meados de 1987 foi gravada na casa de Miltão uma demo de forma bem rudimentar, mas que dava para mostrar o som do “Krânio Metálico”. A demo foi intitulada de “Bravos Headbangers” e tinha as músicas: Velocidade da luz, Garras de tigre, Jamais nos traiam, Bravos headbangers, A vida, 666, Batalha feroz. O objetivo era enviar para a revista Rock Brigade, que nesta época já era uma das pioneiras e especializadas em Rock pesado, com mais de 20 edições publicadas. Entretanto, esta gravação caiu no cu de Deus e nem ele sabe onde está.


Vale lembrar que em 1987 o mundo já estava entregue ao Deus Metal, a maioria dos grandes nomes que conhecemos hoje e que fez escola já haviam lançado álbuns ou estavam lançando algo naquele ano: Black Sabbath, Candlemass, Scorpions, Metal Church, Slayer, Grim Reaper, Metallica, Megadeth, Dark Angel, Destruction, Saint Vitus, Twisted Sister, Motorhead, King Diamond, Helloween, Judas Priest, Coroner, DRI, Mercyful Fate, Death, Venom… Dentro do cenário brasileiro o Sepultura já penetrava as pregas do mundo e lançava o Schizophrenia, havia também outras como Korzus, Taurus, Azul Limão, Salário Mínimo, Harppia, Dorsal Atlântica, Vulcano, Sarcófago, Vodu, Napalm, Centúrias, Viper… além do Metal, o cenário de Rock Progressivo brasileiro já estava derretendo mentes.


O auge do Krânio Metálico - o show com o Vulcano

Naquela época toda a comunicação era feita por meio de cartas, fax, telefone (com fio e extremamente caro), e com o até hoje mais eficaz equipamento de comunicação: a boca! Foi com essas ferramentas que o “KM” se tornou uma lenda do Metal e alcançou lugares inimagináveis. Mas a postura da banda nunca foi passiva, muito pelo contrário. Recebia convites para shows, mas também se prostituía e entrava na berlinda fazendo o corre atrás de parcerias e locais para tocar, e foi dessa forma que o “KM” chegou ao momento do seu auge, que foi tocar em Santos/SP, com a banda Vulcano que na época já tinha lançado quatro álbuns, sendo um ao vivo.


Miltão explica: “Cara, não lembro exatamente, mas a coisa foi mais ou menos assim: nós conseguimos o telefone do pessoal do Vulcano em um encarte de vinil ou fita demo deles. E naquela época o telefone que vinha impresso nos materiais não era de agentes, empresários ou gravadoras, pois nenhuma das bandas tinha nada disso, então era o telefone de um dos integrantes da banda ou da casa de um amigo ou parente. Eu anotei esse número, passei a mão no telefone e simplesmente liguei para o número que era da casa do Zhema, que era guitarrista/baixista da banda”.



“Alô, Zhema? Aqui é Miltão do “Krânio Metálico”, da Bahia”

“Porra, Miltão, diga, como andam as coisas?”

“Tá tudo bem. É o seguinte, a gente da “KM” tá muito

a fim de tocar com vocês, e temos uma proposta para ver se rola”

“Porra, que foda! Como seria?”

“Vocês viriam aqui na Bahia tocar com a gente

e depois a gente ia tocar com vocês”

“Cara, sensacional. Fechado! Depois a gente acerta os detalhes”



Simples assim! Tá bom para vocês? Isso foi em um telefone com fio em algum lugar de 1987. E você aí com seu Iphone874 tentando fechar negócio com o cara da padaria. Viva o analógico! Dessa forma ficou acertado do Vulcano vir para a Bahia, para a cidade de Itabuna, que geograficamente seria o melhor ponto para o deslocamento SPxBA, e com uma estrutura e base de fãs já conhecida pelo “KM”. Pouco depois do show em Itabuna, que ocorreu no início de 1987, o “KM” seguiu para Santos para o que seria o seu primeiro grande show em termos de estrutura e capacidade da casa, além de ser fora das terras baianas.


O show ocorreu no circo Marinho (Santos/SP), lotado, em 18/04/1987, em um festival chamado South American Death, com as bandas Krânio Metálico, Dorsal Atlântica, Vulcano e Massacre (Chile), com a cobertura da Rock Brigade. Só nesta fase que o “KM” teve seu primeiro contato com estúdio de verdade para ensaio. Um episódio peculiar aconteceu por lá, os integrantes do “KM” estavam sentados e um simpático pau no cu largou uma piada para com o pessoal da banda “Vão tocar Axé? Mexer a bundinha?”. Educadamente, Jorge Kiss se levantou e aplicou uma breve sequência Caetanesca: “Meia-lua inteira, Sopapo na cara do fraco”, que desabou no chão, e antes do couro comer geral, avisaram que eram os caras do “KM” e a coisa se acalmou. O show correu com perfeição, com o público boquiaberto pela oportunidade de poder constatar que a tal banda de Metal baiano realmente existia. Ao final do show, Miltão, Paulinho e Luciano se entregaram ao teto sonoro enérgico das mãos metaleiras e num stage diving foram desde o início do palco até o fim, embevecidos na consagração máxima do “KM”.


Esse show rendeu muitas promessas e sementes que não germinaram frutos:

01) foi criado um fã clube no ABC Paulista. Creiam! Uma banda de Heavy Metal baiana sem nenhuma gravação e muitos shows, cuja fama corria pelos porões do underground brasileiro teve um fã clube paulista;

02) esse show foi gravado tanto o áudio quanto o vídeo, mas ambas gravações também caíram no cu de Deus e ninguém sabe onde se encontram, a não ser pelo precário áudio resgatado que está no You Tube, como citado no começo do texto;

03) esse show gerou pré-convites para outros shows em SP, RJ e uma inacreditável possibilidade de fazer um show no Chile, já que a Massacre gostou do som e da energia dos soteropolitanos. Mas infelizmente nada disso aconteceu.


Krânio Metálico - a interminável pausa

Depois do show de SP, ao voltarem para as terras soteropolitanas, o “KM” sofre um primeiro baque em sua história que até então era só de ascensão. O baixista Luciano Nogueira resolve deixar a banda em seu auge. A banda ficou algum tempo sem ensaios e shows até a entrada de Mário Monstro que deu um novo gás, mas por pouco tempo, pois Mário também sairia, aí a banda ficaria mais um tempo sem shows e ensaios até a entrada de Maurício Pondé, que também não durou muito. Fizeram alguns shows, mas a estrutura “Kraniana” havia sido abalada, o brilho metálico começou a opaquecer, o que levou “ao fim” da banda, tendo o seu último show em algum lugar de 1988. Depois o “KM” rolou ladeira abaixo até encostar em um jazigo do tempo e começar a pegar poeira e nunca mais emitir nenhum ruído metálico, que não fosse a falácia em torno da banda que até hoje, mais de três décadas, ainda é grande.


O afastamento total se deu no início dos anos 90, por conta do “cotidiânus” da vida, poeira dos dias, necessidade de ganhar o pão, falecimento de Paulinho (2004) que era uma dos Krânios centrais da banda, o que naquele momento tornou ainda mais longe a possibilidade de uma retomada. Depois houve o recente falecimento de Mário Monstro (2024). Miltão seguiu sua estrada acadêmica, Jorge com seu trabalho na prefeitura, Luciano Nogueira inicialmente foi para o RJ e atualmente reside em Minas Gerais, onde é dono de um bar (bar_dobarbudo), Mauricio Pondé, a trabalho fora das artes, foi para o Espírito Santo e  Jorginho até então trabalha com mecânica automotiva.


Artisticamente depois da pausa do “KM” Miltão, Jorginho, Luciano e Jorge não se envolveram em quaisquer trabalhos musicais. Jorge ainda escreve e desenha. Maurício Pondé tocou um tempo com a The Cross; Paulinho fez alguns freelas no Axé, e Mário Monstro flertou com o Blues.


Krânio Metálico - legado invisível

Após o fim das atividades do “KM” com a maior abertura sonora para chegada de mais materiais de Metal houve uma safra de bandas de som pesado, influenciadas pelos novos materiais que chegavam, mas certamente também pela influência do “KM”. Podemos citar bandas como The Cross, Malefactor, Headhunter, Mercy Killing, Peacemaker e várias outras que foram safrando a cena conforme o passar dos anos.


Rogerio Big Bross, um dos Exús do rock baiano, deu a primeira sacudida para uma possível retomada em 2023. Começou a atiçar o público com fotos nostálgicas nas redes sociais, o que despertou o imaginário dos headbangers da época e dos que não tiveram o prazer de ver a banda em ação, como é o meu caso. Quando o “KM” acabou, eu ainda comia merda num ato de vandalismo e autonomia escutando o disco amarelo dos Patinhos. Desde então a poeira daquele Krânio encostada num jazigo desde final dos anos 80 foi sacudida e há movimentos que podem levar ao espanamento, polimento, fisioterapia mandibular e quem sabe finalmente fazer aquele Krânio Metálico voltar a brilhar sob a pele negra da pantera Jorge kiss.


Quando perguntado se fossem gravar algum material hoje, se gravariam coisas novas ou as canções da época do “KM”, Miltão responde: “Gravaríamos certamente o repertório da época aquilo nos representa até hoje… talvez tenhamos que dar uma reduzida na velocidade por conta da idade e tempo sem prática” — risos.


Até a data de finalização deste texto, há movimentações, ainda em estágio inicial, da feitura de um documentário sobre o “KM”, que apesar de ter pouca coisa divulgada, tem muita coisa guardada e organizada, em poder de Jorge Kiss. O cara tem material que daria para abrir uma saleta especial num museu do RockBaiano, caso existisse. Há também a tão esperada possibilidade de uma gravação ou, ao menos, um show para selar essa história.


Bom, a minha parte como headbanger e escritor, nessa espanada para uma retomada, foi feita. Cá está a biografia deste caboclo do Metal Baiano. Agora é esperar que os cinquentões e sexagenários do “KM” que continuam com sangue noszóio consigam forças, grana, tempo, energias e o que mais seja necessário para que esse caboclo finalmente desça, se manifeste, tome corpo e registre a sua presença sonora nos anais do rock baiano e brasileiro.


Em sua curta carreira no meio underground contabilizam mentalmente uma média de quase cem shows, o que é muito, dado o tipo de som e toda a situação já contada. Ou seja, os caras fizeram seus nomes como “Bravos Headbangers” empunhando seus instrumentos e ideologia Heavy Metal.


Os entrevistados, Miltão e Jorge Kiss, fizeram questão de agradecer a todos que puderam lembrar, que de forma direta ou indireta, ajudaram o “KM” a escrever seu nome na história do Metal-BR. São eles: Luciano Aquático, Caius, Caco, Serginho, Marquinhos, Antonino, Alerrandro, Rock Brigade.


Fica também um salve todo especial em memória aos Krânios que já se foram: Paulinho (guitarrista) e Mario Monstro (baixista).



Referências:

Acervo pessoal de Jorge Kiss

Entrevista realizada em 17 de agosto de 2024


*As informações contidas neste texto são de responsabilidade dos entrevistados e dos materiais consultados, podendo haver divergências dos fatos citados e de sua cronologia.


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