Hoje eu parei pra pensar. Seriamente, decidi parar para pensar. Sentei comigo mesmo, disposto a uma conversa franca sobre os pensares. E não demorei muito para tomar a decisão. Basta o tempo que perco e perdi em toda minha vida, pensando em tudo — sim, pois nunca ganhei nada pensando demais, só um turbilhão de dúvidas, algumas desavenças e títulos “deshonoríficos”, — absolutamente tudo. Nada de decisões fáceis, práticas ou sem fundamentações: “Empada de bacalhau ou camarão?”; “Qual a marca da cerveja?”; “Cirurgia aberta ou por videolaparoscopia?”; política; futebol; mulheres; economia; lazer; tecnologia; relações humanas; técnicas masturbatórias; rótulos de sabão; lugar em que comer; filme que vou assistir; posição em que vou trepar; papel higiênico que vou comprar; desculpa que vou dar; roupa que vou usar; hora que vou sair e voltar; em qual das flertantes investir; técnicas para não se suicidar; formatação que usar no texto; tipo de queijo pra combinar com o tipo de vinho. Tudo dispara o maldito gatilho do pensar. Diversas vezes fico tonto ou com dor de cabeça, de tanto pensar. E do que adianta? Aí fico pensando se devo tomar remédio ou só deitar e tentar dormir.
Pensei... aí, tá vendo? Merda! Não consigo, sequer, começar um parágrafo sem pensar! Pois bem, como dizia, eu estava REFLETINDO sobre a possibilidade de parar de pensar – eu falei REFLETINDO e não, pensando — e dispensar os pensamentos. E após umas sessões de yoga – foi foda escolher qual tipo de yoga seria mais adequado a situação, — consegui dispensar — [dis-pen-sei]. Isso mesmo: dispensei o pensamento e me dei conta de que não é impossível fazê-lo. É bem difícil:
mas se continua a pensar de forma desenfreada:
despenca, repensa, pensa que não pensa
e vira escravo da imprensa, que diz que pensa
e dispersa o que interessa aos que pensam
ou que poderiam gostar de pensar,
em algo diferente do que lhes jogam, sobre a carcaça.
Quadradinho de oito; mensalão; eleições; delegado corrupto; o famoso que levou corno; a puta que trocou o silicone; a queda do avião; o salário atrasado dos jogadores; a copa do mundo; bolsa família; fotos de famosos na praia; crise na Ucrânia; vencedores do BBB; a pílula do dia seguinte que comprei para Isabel. Puta merda! Será que ela tomou direito aquele negócio. Vou até anotar aqui para ligar para ela. Me sinto intruso, querendo cuidar do corpo dela, mas se eu não o fizer, pode ser que um pequeno corpo, com partes minhas, se forme lá dentro. Vou mandar SMS, é menos íntimo. Mas como falava. Tava falando de que mesmo? Deixa eu ler aqui em cima. Paramram... taram.. tarammm... corpo... Isabel... copa... ah, sim, lembrei! Pois bem, são muitas coisas na cabeça e a grande maioria dessas tais coisas são impostas pela mídia, pelo simples fato de ter a plenitude dos cinco sentidos. E olhe lá! Meu vizinho é cego e encasquetou que mandaram um tênis, que ele comprou na internet na cor errada. Não é que o filha da puta tava certo. Ele queria o tênis com detalhes verde limão, igual ao do galã da novela, mas mandaram laranja, porque já estava esgotado. E não para por aí, revistas, outdoors, internet, poup-up, as malditas mensagens de telefone, mala direta, e-mail, twiter, a maldição do facebook e whatsApp, etc. Aí, disparei, tá vendo!? Lembra da yoga, lembra da yoga; a nova dieta detox; o funk da moda; lembra da yoga; inundações no Pará; seca na Bahia; respira meu filho, respira; nova barriga chapada da modelo, quiz para testar seu nível de estresse; lembra yoga, reaquece seus chacras; Geisy Arruda grávida; gente nua protestando; lembra da yoga, lembra da porra da yoga, filha da puta!.
... um silêncio em mim ...
Que se foda a porra da yoga, eu vou fumar um cigarro e tomar um copo d’água, do filtro, que é pra não me perguntarem a marca da água ou se é com gás ou sem gás.
Diante disso tudo,
reparei, que no exato momento
em que decidi parar de pensar,
voltei a pensar. E ao olhar para os lados,
vi toda minha situação, sem ação ou sintonia
e as paredes imundas do mundo
dissolvendo sobre minha absolvição
daí: resolvi parar de pensar novamente.
Ahhh caralho!! Tô ficando tonto. Tomo remédio ou deito? Que se foda! Eu vou é no armazém do Grilo, pedir a empada mais gostosa ou a maior e a cerveja mais gelada. E quanto à cirurgia? Vai ser a que o plano e meus exames permitirem.