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Cega de raiva

Atualizado: 4 de mar. de 2021

— Olha aqui, sua vagabunda, você pensa que é esperta, né? Mas eu sou mais. Não vá pensando que eu sou otária não, viu? Eu peguei todas as mensagens que você mandou para meu marido. Estou na sua cola!

— Quem é que está falando?

— Quem é que tá falando? Você vai saber quem é que está falando em breve, sua desavergonhada. Fica dando em cima do homem dos outros. Me aguarde, o seu está guardado.... Vaca! — desligou o telefone.

Virna ficou furiosa depois de receber aquela ligação desaforada. Foi à cozinha, tomou um copo de água, colocou os óculos e foi ver quem tinha feito a ligação. “Número desconhecido”, era o que tinha escrito no visor do aparelho. Depois que se acalmou, continuou seu dia normalmente, esquecendo-se até do episódio, mas isso foi por pouco tempo, pois, nos dias seguintes, continuou a receber ligações desaforadas com ameaças e ofensas. Realmente, não entendia o que havia acontecido, pois em momento algum havia dado ou daria motivo para a ocorrência de tal situação. Nunca havia se envolvido com homens casados — ao menos que soubesse — e conhecia toda a família do seu atual namorado, com quem já estava junto há alguns anos. Começou a ficar cada vez mais preocupada, pois, além das ligações, passou a receber mensagens e cartas anônimas enviadas para seu trabalho. Resolveu falar com o namorado, e, juntos, tentaram tomar algumas providências, como falar com amigos que eram policiais e ir até a operadora, na tentativa, sem sucesso, de conseguir o número da mulher ameaçadora.

— Dorme, puta, dorme, sua vagabunda, que, em breve você vai dormir é para sempre se não deixar meu homem em paz. Saiu para jantar ontem com ele, não foi? Mas saiba que, pra quem ele volta, é pra mim, pra esposa dele!

— Olha aqui, sua desequilibrada, eu não sei e nem quero saber quem é o babaca de seu homem. E se você não parar de me ligar...

— Vai ter o que? Vai tomar ele de mim, é? Kákákáká, queridinha.

Nesse instante, Virna ouviu, no silêncio da madrugada, um carro sair cantando pneu pelas ruas. Correu, olhou na janela, mas não conseguiu ver mais nada. Virna então tomou uma atitude simples, mudou o número do celular e parou, então, de receber as ligações que a incomodavam. Passaram-se meses e nenhuma ligação, tudo parecia normal, até que passou a ter a sensação de estar sendo seguida, mas nunca conseguia ter a certeza. Era apenas uma sensação que a rondava. Sempre que procurava por alguém, nada achava. Aquela sensação dava calafrio nela.

Numa manhã de primavera bastante agradável, Virna saiu de seu apartamento para fazer sua habitual caminhada e, enquanto andava na calçada, percebeu um carro a toda velocidade surgir absolutamente do nada e seguir em sua direção. Tentou correr, esquivar-se, mas o medo a paralisou enquanto via a morte lhe alcançar. O impacto do para-choque do veículo sobre as pernas de Virna a fez voar como um fantoche, caindo a uns 10 metros adiante, totalmente ensanguentada e imóvel.

A motorista do carro deu ré, com um olhar furioso de satisfação, mas com extrema calma voltou para a pista, passou ao lado do corpo ensanguentado de Virna e falou a si mesma rangendo os dentes: — Vai almoçar agora com o Diabo, sua puta. Marcando almoço romântico com meu homem, hoje, em pleno dia de meu aniversário. Isso foi o cúmulo! Agora quero ver você roubar mais homem de ninguém. Só se for no inferno!

Ao chegar em casa, certificou-se que o esposo ainda dormia, tomou um banho e preparou uma farta mesa de café da manhã. O telefone de seu esposo sinalizou uma mensagem recebida. Imaginou ser algo referente ao que acabará de fazer. Talvez uma mensagem de alguém próximo aos amantes. Pegou o celular, colocou a senha, que ele já havia trocado várias vezes desde que foi indagado sobre ter uma amante, e ao pressionar o lembrete de mensagem, uma voz sensual, dengosa e feminina disse do outro lado: — Ô, meu paizinho, vem logo. Sua cachorrinha tá morrendo de saudade!

Ela gelou, ouviu e reouviu a mensagem, conferiu a hora de envio e havia acabado de ser enviada. Imaginou ser ilusão ou castigo divino. Como aquela mulher que havia acabado de atropelar e provavelmente matar podia estar ao telefone? Em seguida foi recebida uma foto de uma mulher de calcinha na frente de um espelho, com a legenda “Tô te esperando!”. Não crendo naquilo e desnorteada, conferiu minunciosamente a mensagem e viu que era ela mesma, o mesmo número para qual ela ligava — o antigo de Virna —, com uma pequena diferença, o DDD era 74, enquanto o DDD do número de Virna era 71.

Não aguentou a pressão que sua própria consciência exerceu sobre si. Foi até a polícia e se entregou. Matou Virna, pensando ser a amante do marido, pois, quando descobrira as ligações e mensagens, tinha ficado tão cega de raiva que anotara o telefone sem se atentar ao DDD.

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